Quando
se está verdadeiramente apaixonada, o mais importante é estar junto ou, ainda
que distante do outro, estar conectado de alguma forma. Fico pensando, então, o
que é pior para uma mulher apaixonada: ser abandonada na porta do altar ou na
porta do cinema.
Gabriela
ficou horas esperando para se casar, pois o noivo tomou um pileque na despedida
de solteiro e quase teve um coma alcoólico. Mesmo assim apresentou-se com
atraso, munido do comprovante de internação. Casaram-se.
Carolina,
melhor amiga de Gabriela, conheceu um moço elegante num dia de agosto,
inteligente e carinhoso, sempre muito atencioso, um lindo menino que a cativou.
Foi numa noite fria de inverno que se encontraram quase ao acaso. Sua gentileza
e sorriso aproximaram os seus corações. A chuva fina e o frio aproximaram os
seus corpos. Marcaram então um cinema para a semana seguinte.
No
dia marcado investiu algumas horas nos preparativos e no translado até o local
marcado. A hora do filme se aproximava e ele não chegava. Ela, já inquieta,
comprou os ingressos e depois a pipoca. Já chegava a um nível de ansiedade que
comia a pipoca antes mesmo de entrar no cinema. Enfim chegou... Chegou uma
mensagem no seu celular:
“Tive
um imprevisto esta semana no meu trabalho, não conseguiria chegar a tempo.”
Como
assim “um imprevisto esta semana?” Poderia ter avisado no dia anterior, até por
telefone, pensou Carolina. Lembrou-se da amiga Gabriela e da história do seu
casamento, tentou consolar seu coração, mas foi inevitável interpretar a
mensagem subliminar:
“Eu
não sabia bem se queria ir ao cinema com você, como estava aqui nessa dúvida e
só agora decidi que realmente não quero, mas não sabia como dizer, eu aproveito
o imprevisto pra ir embora. Por favor, não insista.” Assinado: imaginação da
Carolina.
Sentou-se
na rua, no meio fio em frente ao cinema, com o saco de pipocas nas mãos, chorava
compulsivamente. Ligou pra amiga Gabriela que se comprometeu com o seu resgate,
acabada e abandonada na porta do cinema. Em meia hora Gabriela chegou e se
deparou com a cena: Carolina desfigurada, desolada e descabelada. Até o
pipoqueiro fazia afagos e dizia que ia ficar tudo bem.
Gabriela,
grande amiga, procurou ser razoável, dizia que isso acontece e que deveria ser
compreensiva, que o motivo era plausível e logo ele se retrataria.
_
Amiga, eu investi meu sentimento, gastei horas me preparando para o encontro,
fui ao salão fazer as unhas e depilação meia perna...
Gabriela
interrompeu a fala da amiga descabelada e parou de tentar amenizar as coisas,
partiu para o ataque:
_
Nunca desperdice a depilação de uma mulher! Pare de chorar por alguém que não
te merece! E veja se da próxima vez que marcar algo com alguém marque o bom e
tradicional barzinho.
Carolina apenas queria que percebesse que era
ele o ator principal com direito a indicação ao Oscar, o filme era apenas o
coadjuvante naquele encontro. Numa atitude adolescente, ligou pra ele
dizendo-lhe que “é um homem irracional e insensível” e nem deu tempo para que
respondesse. Bloqueou-o no celular, desfez a amizade no facebook, excluiu todas
as mensagens e vestígios de sua passagem em sua vida. Do meteórico romance só
restou essa crônica, nenhum filme será rodado.
Nota: Homem Irracional, filme do gênero drama dirigido por Woody Allen, EUA - 2015.