segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Gabriel, o filósofo 


No início foi difícil, escondido, mas afinal eu não estava cometendo nenhum pecado:
_ Não vou falar, não vou falar, vou falar: fiz um perfil em um site de relacionamentos. Pronto falei!

É como estar em uma festa com muitas pessoas falando com você ao mesmo tempo, no entanto tem sempre alguém que chama a sua atenção, se destaca dos demais. E foi num site de relacionamentos que conheci Gabriel46, acho que não foram os pais que colocaram esse nome na criatura, mas é assim a alcunha da grande maioria das pessoas nesses sites, tem códigos do tipo “ano em que nasceu” ou, como eu, denunciando a idade que é pra não haver equívocos: que fique muito claro que já estou na “melhor idade”.

Não me lembro quem piscou primeiro o olho virtual, mas Gabriel46 me fez uma pergunta que me fez vê-lo de uma forma diferente: “você prefere o dia ou a noite?” Li e reli seu perfil antes de responder pra me certificar de que havia “compatibilidade”. Sua foto de óculos redondos iguais ao de John Lennon, jaqueta de couro, numa pose sedutora do tipo “tô aqui pro que der e vier, se vier comigo”. Respondi: “prefiro a noite para ver as estrelas”. Imediatamente chegou nova mensagem: “você gosta de sorvete?” Pensei então: que tipo de homem seria Gabriel46, de uma inteligência rebuscada, perguntas tão simples e profundas que me davam a possibilidade de tantas respostas?  Respondi então: “gosto de sorvete, de chocolate, de café e de andar pelo centro do Rio sábados à tarde, e você?” E outra pergunta: “Qual sua cor predileta?” “Gosto do vermelho, do laranja, pois que sou decidida e criativa, mas também gosto do azul e do verde que me acalmam e equilibram...” E as respostas eram cada vez mais longas e densas.

A essa altura pensava em Gabriel, seja qual for seu número, código ou idade, como um grande filósofo contemporâneo, a pessoa que eu procurava para passar o resto dos meus dias, beleza rara de se ver. Mas depois de responder cerca de quinze perguntas pude perceber que ele nunca respondia às minhas e começou a repeti-las: “você já me perguntou isso Gabriel”; “isso eu já lhe respondi”, “mas você ainda não respondeu à pergunta que lhe fiz!”


Foi só então que percebi que Gabriel46 não era assinante e que aquelas eram perguntas prontas do site. Ai, ai, ai... o romance acabou e Gabriel46 foi minha primeira desilusão virtual! 

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